O secretário estadual de Saúde, Ruy Pereira dos Santos, responsabilizou ontem os médicos das 16 especialidades de alta complexidade pelo sofrimento que os pacientes do SUS vêm enfrentando nesses 56 dias de paralisação. Também acusou os profissionais e os hospitais privados de estarem desrespeitando uma decisão judicial que manda atender os casos de urgência e emergência e 30% dos procedimentos eletivos.
Em entrevista ao programa Panorama Geral, da TV União, e em tom de desabafo, o secretário criticou o movimento convocado para o dia 12, quando a categoria pretende trabalhar com uma tarja preta em protesto contra os baixos valores pagos pela rede pública. “De luto está a população, de preto estão as famílias enlutadas dos pacientes que estão morrendo, do povo que está sofrendo. Não aceitamos mais essa conduta. O governo não vai ficar refém de uma situação dessa. Isso é uma indignidade.”
O secretário sugeriu aos médicos cumprir o juramento ético de atender o paciente, possa ele pagar ou não pelo procedimento, e lembrou que na condição de gestor da saúde, quando assessor do então ministro Humberto Costa, mediou alguns conflitos, mas não como o de Natal. “Nunca vi tanta intransigência por parte da categoria. Parece até que a população é um mero detalhe. Ela não pode pagar com a própria vida uma intransigência adotada por pessoas racionais, que se formaram em universidades públicas e tiveram o seu ensino bancado pela sociedade.”
Ruy Pereira disse ainda que está convocando entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil e os conselhos de Direitos Humanos para uma visita ao hospital Walfredo Gurgel. “Estamos chamando essas entidades para verificar o que os colegas estão fazendo. Negando-se a atender o povo.” Afirmou que está encaminhando ao juiz os nomes e os diagnósticos dos pacientes da lista de espera e que vai pedir ao magistrado que inclua os médicos como litisconsorte na ação “porque os hospitais estão dizendo que realizam as cirurgias pela tabela do SUS, mas os médicos dizem que não operam e pronto.”
Para não ficar refém da rede privada, Ruy Pereira assegurou que a Secretaria Estadual de Saúde deve habilitar, dentro de 60 dias, os hospitais públicos de ortopedia, traumatologia, neurocirurgia e cirurgia vascular a realizar esses procedimentos. Na entrevista, ele concordou que o valor pago por uma consulta é baixo, mas observou: “quando os colega colocam que uma consulta médica especializada custa R$ 7,50, eles estão mostrando que é um pagamento aviltante. Mas não dizem que através dessa consulta eles diagnosticam, por exemplo, um problema cardíaco. Se for preciso colocar um “stent”, que custa R$ 1.200, o hospital recebe R$ 2.800 do SUS. Só ai o hospital ganha R$ 1.600, fora os procedimentos. Nós temos cirurgias que nem a rede privada paga o que o SUS paga”, comparou.
E completou: “Com a tabela que o SUS tem, o dinheiro dá para atender a todas as especialidades, mas se formos pagar a tabela que os médicos querem, vamos ter de tirar dinheiro da atenção básica, da média complexidade, da dengue, vamos ficar só operando alta complexidade, e abandonando o resto da saúde pública, o que seria uma irresponsabilidade.”
“Cheguei ao limite”, diz gestor
“Não tenho mais estrutura emocional. Cheguei ao limite.” O desabafo do secretário de Saúde Ruy Pereira à reportagem da TRIBUNA DO NORTE demonstra o grau de indignação do gestor com as cenas que vêm observando diariamente na imprensa, nas quais são retratados pacientes à espera de cirurgias. “Quero que eles (os médicos que aderiram à paralisação) me provem que um paciente imobilizado em uma cama, com um peso de dez quilos tensionando sua perna, ou alguém com câncer, sabendo que um dia a mais pode significar sua vida ou morte, são casos eletivos”, desafiou.
Ele criticou ainda a “terceirização” de honorários admitida ontem pelo presidente da Associação Médica, Geraldo Ferreira, à TN. Através desse artifício, os médicos não credenciados ao SUS realizariam procedimentos e receberiam os pagamentos através de médicos integrantes do sistema. “Não faria isso nem por meu irmão. Se eles estão conscientes disso, estão praticando uma ilegalidade e uma loucura, pois é atrás deles que o Fisco e o Imposto de Renda vai”, alertou.
Ruy Pereira lamentou ainda que a categoria se negue a conversar com a secretária de Saúde de Natal, Maria Aparecida França. “Como podem negociar, se não admitem sequer sentar com a gestora.” Ressaltou ainda que o clima para o próximo dia 12 não deve ser de comemoração, mas sim de velório – “E bem pode ocorrer um até lá” – e esclareceu ainda que as emendas obtidas na Câmara Municipal e na Assembléia Legislativa (somando R$ 1,5 milhão) são absolutamente insuficientes para resolver a questão.